quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

RISCO DE VERGONHA INTERNACIONAL

JORNAL DO COMERCIO 26/02/2013

Reale Júnior considera anteprojeto um risco de vergonha internacional . Ex-ministro da Justiça critica pressa nas discussões sobre a mudança no texto legal


CLAUDIO FACHEL/ARQUIVO/JC

Jurista condena aumento de penas, como para casos de difamação e calúnia por meio da mídia

A partir de quinta-feira, as discussões em torno da proposta de reformulação do Código Penal prometem ser retomadas com a ida do jurista e ex-ministro da Justiça Miguel Reale Júnior a uma audiência pública na comissão especial do Senado que analisa do assunto. “Eu vou levar a nossa contribuição, que não é só uma manifestação minha, mas, na verdade, retrata a posição de cerca de 20 entidades, do Ministério Publico, da associação de advogados, e dos institutos de Direito e Criminologia. Vamos levar nossas preocupações e, muito tecnicamente, analisar as questões que nos preocupam intensamente com relação às impropriedades que o projeto apresenta”, adiantou o criminalista.


Reale Júnior é um dos maiores críticos do texto - entregue aos senadores em junho por uma comissão de 15 juristas - e foi convidado para apresentar sua análise sobre a proposta. Em nome da comissão de juristas, o relator-geral do trabalho, o procurador da República Luiz Carlos dos Santos Gonçalves, também vai participar do debate.


Para Reale Júnior, o andamento da atual proposta traz “o risco de uma vergonha internacional”. Entre os pontos criticados pelo jurista, está o que trata de crimes de imprensa. Para ele, a proposta é rigorosa no que diz respeito à difamação e à calúnia por meio da mídia. “A pena mínima, de três meses, passa a ser de dois anos, por uma difamação por meio de imprensa. Isso é oito vezes superior à da Lei de Imprensa, que foi revogada por ser ditatorial”, argumenta.


Ainda segundo o criminalista, outro trecho prevê condenação de dois a quatro anos para quem assiste a um confronto entre animais, como, por exemplo, uma rinha de galo. “É uma pena elevadíssima. Se o animal morre, a pena é de quatro anos, no mínimo. O sujeito assiste e é responsabilizado pelo galicídio?”, questiona. Ele também critica o perdão judicial no caso de a eutanásia ser praticada por parentes, independentemente do diagnóstico médico.


O projeto em discussão também é alvo de críticas políticas, morais e religiosas. Uma das polêmicas é sobre novas hipóteses de aborto legal - atualmente permitido em caso de risco de morte para a gestante, quando a gravidez decorre de estupro ou se o bebê for anencéfalo. “Essas questões religiosas são menores perto dos vícios e dos problemas que existem. Porque, na hora que você joga para esta área, a discussão se emocionaliza, passa a ser filosófica, religiosa, e a minha questão não é esta. A minha questão é técnica”, garante o ex-ministro.


O jurista discorda da forma e da ‘pressa’ com que a discussão está sendo feita. Na avaliação de Reale Júnior, uma reforma da legislação penal teria de ser diferente. “Eu mexeria pouco na parte geral, exclusivamente no sistema de penas para adequá-lo. O sistema de penas foi modificado por uma lei de 1998 e pela Lei dos Juizados Especais Criminais, por isso precisa ser recomposto. Na parte da estrutura dos crimes, eu não mexeria em nada”, diz. “Isso exige um trabalho imenso de proporção e de revisão porque essas leis são feitas atabalhoadamente. Não se pode apenas transportar essa legislação extravagante para dentro do código. É necessário fazer uma cautelosa revisão dos tipos que são criados nessas leis. É um trabalho de detalhe que demandaria, no mínimo, um ano e meio, dois anos”.


O trabalho da comissão especial de juristas durou cerca de oito meses. A intenção do relator da comissão de senadores que transformou a proposta em projeto de lei, senador Pedro Taques (PDT-MT), é de que o texto seja votado no Senado e encaminhado para a Câmara dos Deputados até o fim deste ano.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

A POLÍCIA E O MP TRABALHAM MUITO MAL


REVISTA ISTO É N° Edição:  2258 |  22.Fev.13 - 21:00 |  Atualizado em 25.Fev.13 - 15:31

Tourinho Neto: "A polícia e o MP trabalham muito mal"

Perto da aposentadoria, juiz que mandou soltar Carlinhos Cachoeira diz que delação premiada é traição e acusa seus colegas de decretar prisões preventivas com base apenas em suposições


por Claudio Dantas Sequeira


TOGA AFIADA- Para Tourinho Neto, procuradores invadem a competência do juiz ao oferecer denúncia como se fosse “sentença condenatória”

O juiz Fernando da Costa Tourinho Neto vai pendurar a toga em abril, aos 70 anos, 42 deles dedicados ao Judiciário. Constitucionalista, apegado aos direitos humanos, contra a lei seca, fã do MST e crítico à indicação política de magistrados, Tourinho Neto não se enquadra facilmente em classificações. Mas corre o risco de encerrar a carreira com a alcunha de “juiz de bandido”. Este ano, ele mandou soltar o bicheiro Carlinhos Cachoeira e anulou provas da operação da Polícia Federal contra o ex-presidente da Valec José Francisco das Neves, o Juquinha. O magistrado, contudo, não teme o linchamento público. Em entrevista exclusiva à ISTOÉ, considera a “reação natural” de uma sociedade indignada com a crescente corrupção. Mas pondera: “Que o povo pense assim, tudo bem! Mas não as autoridades.”

Tourinho alerta para o que chamou de “afã” em condenar que, segundo ele, ameaçaria garantias individuais e contaminaria inquéritos, denúncias e julgamentos – para ele, o do mensalão, inclusive. Sem medo de polêmica, o juiz critica a teoria do domínio do fato usada pelo Supremo para condenar o ex-ministro José Dirceu. Para o magistrado, a impunidade deve ser combatida com celeridade processual.


"O Beira-Mar está sendo torturado. Fica numa sala pequena, é vigiado 24 horas e não pode usar o banheiro ou tomar banho sem ser filmado"


“Nunca concordei com apadrinhamentos. Eliana Calmon dizia o mesmo, mas depois foi lá e pediu a bênção do ACM e do Jader". Fotos: Adriano Machado/ag. istoé; CELSO JUNIOR/AG. ESTADO/AE


ISTOÉ - O sr. se aposenta em abril. Vai fazer o quê?

TOURINHO NETO - Pensei em dar aulas, mas não gosto de horário fixo. Então, acho que vou advogar.


ISTOÉ - Como recebe as críticas por ter liberado o bicheiro Carlinhos Cachoeira e anulado as provas da Operação Trem Pagador, da PF?

TOURINHO NETO - Não sou a favor do crime. Quero o rigor, mas também a defesa intransigente dos direitos e garantias individuais previstos na Constituição. Sou um constitucionalista e também um humanista. Falam que eu concedi habeas corpus para o Cachoeira porque ele é rico e influente. Ora, isso é uma bobagem, um absurdo! Todos os dias eu concedo para gente pobre que ninguém conhece.
ISTOÉ - Mas não havia o risco de Cachoeira destruir provas ou fugir?

TOURINHO NETO - Se esse risco existe, ele não foi demonstrado pela polícia e o Ministério Público. Não se pode manter alguém preso por suposição. Hoje o que mais tem é juiz decretando prisão preventiva com base em conjecturas. A lei proíbe isso, está no artigo 312. Tem que ter prova da existência do crime, indícios suficientes, não só a suspeita.

ISTOÉ - No caso do Cachoeira não havia esses indícios?

TOURINHO NETO - Não posso ficar falando do caso em que atuo, mas o fato é que um juiz não pode decretar a quebra de sigilo ou a prisão temporária de quem quer que seja com base em suposições. No caso da quebra de sigilo, ela deve ser o último meio de prova. Antes, o delegado deve tentar de tudo.

ISTOÉ - Por isso anulou as provas da Operação Trem Pagador, da Polícia Federal?

TOURINHO NETO - Essa é talvez a operação recente da PF com mais erros que já vi. Eles começaram a investigação com a quebra do sigilo telefônico, que foi deferida pelo juiz, sem antes ter uma investigação. Aí você anula a interceptação telefônica e não resta nada. Ora, isso é ilegal. Dizem que acabaram com as investigações policiais, mas não é assim. Se cumprirem a lei, não anulo, como não anulei várias outras. O STJ também anulou aqueles grampos da Operação Boi Barrica (Facktor) pelo mesmo motivo. A polícia e o MP trabalham muito mal.

ISTOÉ - O sr. se acha mal compreendido?

TOURINHO NETO - Por boa parte do Ministério Público e 80% da polícia. Mas não posso ser cúmplice de inquéritos malfeitos, denúncias do MP com base em notícias de jornal. Juiz não está aí para combater o crime, mas para julgar com imparcialidade.

ISTOÉ - Os delegados, promotores e juízes de primeira instância estão despreparados?

TOURINHO NETO - Eles são preparados. O problema é que há um afã em prender e condenar. A polícia às vezes prende 80 pessoas numa operação, mas será que todos participaram do crime da mesma forma? Parece que há uma necessidade em prestar contas à sociedade para alimentar a mídia com notícias.

ISTOÉ - Isso aconteceu no mensalão?

TOURINHO NETO - Não entendo essa teoria do domínio do fato usada pelos ministros. É muito perigosa. Julgaram o ex-ministro José Dirceu sem provas. Claro, tudo levava a crer que ele comandava, pois os outros não podiam fazer nada sem a decisão dele, mas não tinha ato de ofício.

ISTOÉ - Mas a sociedade está cansada da impunidade...

TOURINHO NETO - Que o povo pense assim, tudo bem, admite-se. Mas que a autoridade pense assim, não dá. Às vezes a pessoa pode parecer culpada, mas é preciso concluir a investigação, tem que fazer perícia, ouvir testemunhas. Imagina se tivéssemos pena de morte? E tudo começa com a imprensa. Ela pressiona pela condenação.

ISTOÉ - O sr. acredita que o Supremo agiu pressionado?

TOURINHO NETO - Pelo que a gente vê dos votos do mensalão, em parte sim. Tinha essa coisa de dar satisfação ao povo. Nesse caso não estou dizendo que agiu errado, pois também havia esse estigma de que o Supremo não condena ninguém por crime de colarinho-branco. Aí chegou o momento.

ISTOÉ - Como ex-promotor e filho de promotor, como o sr. vê a proposta de emenda constitucional que tira o poder de investigação do MP?

TOURINHO NETO - A política investiga, o MP acusa e o juiz julga. Essa separação de poderes garante o estado democrático de direito. A quebra dessa lógica é uma miséria. Sou contra o poder de investigação do Ministério Público, porque normalmente o procurador ou promotor se envolve na investigação. Ele vira um delegado, mas é ele quem deve fiscalizar o trabalho do delegado. Ir à delegacia para acompanhar uma oitiva, pedir à polícia que colha determinada prova e não sair recolhendo dados a seu bel prazer, apresentando denúncia com base em notícia de jornal. Tinha um procurador aqui em Brasília que escaneava as matérias para fundamentar a investigação.

ISTOÉ - Quem era?

TOURINHO NETO - O Luiz Francisco e o Guilherme Schelb. Muitos juízes até julgavam com base nas reportagens. Sou a favor do jornalismo investigativo, mas a matéria deve ser um ponto de partida. E só.

ISTOÉ - E qual a saída para não ficar a sensação de impunidade?

TOURINHO NETO - Temos que ser céleres. Dar celeridade no trâmite processual e nos julgamentos. Não precisa o MP oferecer denúncia que parece sentença condenatória, invadindo a competência do juiz.

ISTOÉ - Celeridade no Judiciário é possível?

TOURINHO NETO - Sou um exemplo dela. Tenho uma rotina intensa de trabalho. Eu tinha 1.400 processos, mas zeramos tudo.

ISTOÉ - Essa rapidez também foi criticada no caso do habeas corpus do Cachoeira.

TOURINHO NETO - Pedido de liminar é para ser decidido em qualquer lugar, até no capô do carro. A liberdade de uma pessoa não pode ser bloqueada por formalismos. Em 2002, tive que conceder um habeas para o senador Jader Barbalho. Era um sábado, eu estava em casa de bermuda, relaxado. Despachei e mandei cumprir. Ele chegou a ser algemado, um absurdo.

ISTOÉ - O sr. é contra o uso de algemas?

TOURINHO NETO - Sou. Só deveriam usar algemas em quem resiste à prisão. Mas a polícia algema idosos, mulheres, pessoas em cadeiras de rodas. Invadem a casa da pessoa e levam a mulher de camisola para a delegacia. É tudo para saciar a sede de justiça do povo. Mas a lei não é um instrumento de vingança.

ISTOÉ - E quanto às novas denúncias de Marcos Valério contra Lula, elas devem ser ou não apuradas?

TOURINHO NETO - Sou contra a delação premiada. É traição. O homem não pode ser um traidor de seus companheiros. Ele estava participando do crime. Ele, ali na quadrilha, dava suas opiniões, praticava o crime. Depois quer os benefícios da delação. É um oportunista, que quer se safar!

ISTOÉ - Mas sem a delação premiada o que seria da Operação Mãos Limpas, que desbaratou a máfia siciliana?

TOURINHO NETO - Para combater o crime, a polícia italiana se valeu da fraqueza de um dos réus. É a falência dos instrumentos de investigação do Estado, que não precisa violar a lei e a Constituição. Hoje, no Brasil, o Estado viola a Constituição diuturnamente.

ISTOÉ - Como assim?

TOURINHO NETO - Para ficar num exemplo, veja o regime disciplinar diferenciado que instituíram nos presídios federais para isolar criminosos de alta periculosidade. Voltamos à ditadura militar. É como a tortura no Dops. Se naquela época tinha um médico que não deixava o sujeito morrer, só para continuar sendo torturado, agora também tem lá o psicólogo que não deixa o preso enlouquecer.

ISTOÉ - Na sua opinião, então, o Fernandinho Beira-mar está sendo torturado?

TOURINHO NETO - Não tenha dúvida que está sendo torturado. O sujeito ficar numa sala pequena, vigiado 24 horas, não pode usar o banheiro ou tomar banho sem ser filmado.

ISTOÉ - O sr. é membro do Conselho Nacional de Justiça. Acha que o conselho cumpre suas funções?

TOURINHO NETO - O problema do CNJ é a Corregedoria, que, no afã de punir, comete erros. A ex-corregedora Eliana Calmon estava doida para punir juiz. Eu disse a ela que as sindicâncias eram legítimas, mas ela exagerava nos pedidos.

ISTOÉ - Ela foi contemporânea sua no Tribunal Regional Federal. O que explica ela ter ascendido ao STJ e o sr. não?

TOURINHO NETO - Nunca concordei com apadrinhamentos políticos para chegar aos tribunais superiores. Eliana dizia o mesmo, mas depois foi lá e pediu a bênção do ACM e do próprio Jader Barbalho, que me acusam de ter beneficiado.

ISTOÉ - Teme que seu apoio à tese dos mensaleiros lhe valha a alcunha de petista?

TOURINHO NETO - Já disseram que sou amigo de bandido, mas petista ainda não. Posso dizer que votei no Lula duas vezes, na Dilma e não votei em FHC. Mas não tenho filiação partidária.

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

APAGÃO DA PERÍCIA CRIMINAL


CORREIO BRAZILIENSE - 20/02/2013 07:55

Estudo aponta para risco de apagão de peritos criminais no Brasil. Pesquisa realizada pelo Ministério da Justiça mostra que o país vive situação de risco na área

Renata Mariz

Uma série de pesquisas divulgadas pelo Ministério da Justiça (MJ) ontem aponta que, mais que falta de recursos, há “graves problemas de gestão” no setor, conforme definiu o titular da pasta, José Eduardo Cardozo. O estudo Diagnóstico da Perícia Criminal no Brasil aponta o risco de um verdadeiro apagão da atividade no país — responsável por obter provas irrefutáveis de autoria dos delitos investigados pela polícia. Cerca de 30% dos quase 10.400 peritos criminais, papiloscopistas e médicos legistas existentes estão próximos da aposentadoria. Regras básicas, como lacrar vestígios da cena do crime e ter local seguro para guardá-los, são inexistentes na maioria das unidades. Milhares de pedidos de laudos estão esquecidos nos escaninhos dos institutos.

Diante do quadro desolador, o MJ planeja gastar R$ 190 milhões este ano na criação e fortalecimento de unidades de perícia forense nos estados. A ideia é tentar, ao menos, vencer o passivo já existente. Há pelo menos 22 mil perícias de local de crime e 29 mil exames necroscópicos, todos relacionados a homicídios, parados. Oito mil armas que precisam ser analisadas estão na mesma situação. “Estamos falando de laudos importantes para a investigação, além do risco desse armazenamento de armas”, comentou Isabel Figueiredo, diretora de pesquisas da Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp), do MJ.

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

PEC 37 - QUEM A TEME?

JORNAL DO COMERCIO 18/02/2013


Getúlio Dorneles Fernandes da Silva


Quem teme os promotores e procuradores? Por certo não são aqueles atingidos pelas exposições midiáticas que acabaram com governo estadual e pisotearam com alguns prefeitos. Seriam, então, aqueles envolvidos na operação “Cosa Nostra” e outras que, após longa investigação, foram denunciadas ao Judiciário? Ou seriam os condenados pelo mensalão?

Sim ou não, creio que os interessados na aprovação dessa emenda são aqueles que temem um acerto de contas com a Justiça. Querer que somente as polícias possam investigar é pretender que continue reinando a impunidade. É público e notório que estão forçando a exclusividade desse trabalho para quem está abarrotado de processos que acabam prescrevendo por falta de pessoal, de veículos, de local adequado e de meios técnicos e materiais para o desenvolvimento de um bom trabalho.

É óbvio que os excessos devem ser abolidos, como o anúncio público e midiático simplesmente porque foi concluída uma investigação. Para isso, deve ser estabelecido um regramento e um código de ética que enquadre aqueles que se prestam, quem sabe, para “aparecer” ou por interesses políticos. Deixemos que promotores e procuradores continuem investigando. Somente dessa maneira teremos mais “fichas sujas”, políticos ou não, prestando contas daquilo que não deveriam ter feito.

Administrador

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

PEC 37 OPÕE DEFENSORIA E MP NO RS


11 fevereiro 2013
Notas de repúdio

O Ministério Público e a Defensoria Pública do Rio Grande do Sul entraram em conflito esta semana. Começou na sexta-feira (8/2), quando o procurador de Justiça Lênio Streck publicou artigo no jornal O Sul criticando a posição do corregedor da Defensoria a respeito de dar ao MP poderes de fazer investigações criminais. Já no mesmo dia, o procurador foi duramente criticado pelos defensores públicos gaúchos e, um dia depois, teve sua defesa feita pela Associação do Ministério Público do Rio Grande do Sul.
No texto publicado no O Sul, Streck comentava um debate que vira na televisão na noite anterior. Discutiam a Proposta de Emenda à Constituição 37, que pretende dar à polícia a exclusividade de fazer investigações criminais. Estavam presentes um membro do MP estadual gaúcho, um representante da ONG Brasil sem Grades (a favor do MP), o corregedor da Defensoria Pública do Rio Grande do Sul e um delegado.
Ele disse ter ficado impressionado com as posições assumidas pelo defensor público, "contundente, distorcendo fatos e teses, parecia o inimigo público n'mero 1 do MP". E questionou as motivações para que o defensor estivesse ali defendendo a aprovação da PEC 37, alegando serem corporativos. "Ouvindo o corregedor, parece que o MP defende ricos e a DP, os pobres. O MP é o 'mau' e a DP, o 'good guy'. Por tudo isso, há que se questionar o papel da Defensoria", escreveu Streck.
No mesmo dia, a Associação dos Defensores Públicos do Rio Grande do Sul (ADPergs) publicou nota de repúdio aos comentários de Lênio Streck. Disse que sua opinião estava sendo dada "de forma genérica e, na avaliação dos representantes dos defensores, descuidada, partindo de um juízo próprio de valores e interpretação pessoal".
Em resposta, no sábado (9/2), a AMPRS também usou de seu site para publicar nota e defender o procurador. De acordo com o texto, a participação do defensor público no debate foi "deslocada". "Transpareceu que a mola propulsora para ali estar era fomentar o ataque às prerrogativas do Ministério Público", diz a nota. O comunicado do MP também afirma que, se a ADPergs apoia o defensor e sua fala, "assume uma postura absolutamente incoerente" quando não aceita as observações de Streck.
Leia o texto do procurador de Justiça Lênio Streck publicado no O Sul:
A INVESTIGAÇÃO DO MP E O QUE PENSA A DEFENSORIA

Por Lenio Luiz Streck
Assisti a um debate na TV sobre a PEC 37, que pretende tirar o poder investigatório do Ministério Público, deixando-o exclusivo para a Polícia. Presentes o Presidente da Associação do MP, o representante da ONG Brasil sem Grades – estes defendiam o MP; de outro, atacando o MP e defendendo o poder exclusivo da Polícia, um Delegado e... vejam, um Defensor Público. Pior: ele era o Corregedor da Defensoria do RS. Nada me impressionou mais no debate do que as posições do Defensor. As demais eram previsíveis. Mas a do Defensor... Contundente, distorcendo teses e fatos, parecia inimigo público n. 1 do MP. A questão é saber: estava ele lá defendendo posição pessoal ou representava o pensamento da Defensoria Nacional?
QUEM DEFENDE A SOCIEDADE?
Tenho sempre defendido a DP. Fiz discursos públicos e defendi teses jurídicas a favor. Sem contar as minhas posições garantistas conhecidas de todos. Mas, agora, ouvindo o que disse o jovem e impetuoso Defensor, assustei-me. Por qual razão a Defensoria seria contra que o MP investigue? Isso facilita seu trabalho? E no que a retirada do MP da investigação – que o STF já disse ser constitucional – feriria “interesses” (a não ser corporativos) da DP? Hein?
FIQUEMOS ALERTAS
Na aliança estratégica entre o delegado e o defensor, chegou-se a falar da ditadura, comparando a investigação do MP com “aqueles tempos”, circunstância que irritou, com razão, o Presidente da AMP. Perguntado sobre o que melhoraria na sociedade com a aprovação da PEC 37, o defensor calou. Por tudo isso, há que começar a questionar o papel da Defensoria. A luz amarela já acendeu com o veto da Pres. Dilma à autonomia financeira. Alguma coisa há aí, pois não? Cheguei a apoiar a derrubada do veto. Mas depois do discurso do Corregedor, estou fora. Aliás, vou começar a indagar sobre: qual é a autonomia do carente? Ele tem direito de escolha? Por que não aumentar o grau de legitimados para defender os pobres? Não há esse “monopólio” na CF. No modelo atual, o pobre fica refém da DP. Ele não é mais defendido...e, sim, substituído. Mas, o defensor tem mais garantias que o defensor constituído.... Pode? O que diz a OAB? Qual é o critério de “pobre”? O MP defende toda a sociedade; a DP, uma parte. Ouvindo o Corregedor, parece que o MP defende ricos e a DP, os pobres... O MP é o “mau”. A DP é o “good guy”. Brasil afora, a DP vem impedindo os municípios, CRAS, Conselhos tutelares e ONG’s a prestarem assistência jurídica. Ela quer ter o monopólio... dos pobres. Por ex., a DP é contra a advocacia pro-bonoBy the way: por que aumentou o número de presos no Brasil? Não seria o “monopólio” o causador? Enquanto a DP se preocupa com ações coletivas, cíveis, etc, as filas dos carentes no crime aumentam. Pois é isso, por enquanto. O Corregedor me fez (re) pensar coisas. Minha esperança é que ele não falou em nome da Instituição. Torço para isso. Mas o olhar dele, a convicção com que falou...
Leia a nota da ADPERGS:

A Associação dos Defensores Públicos do RS - ADPERGS, vem a público manifestar total repúdio ao artigo publicado na data de hoje (8/02) pelo Jornal O Sul, assinado pelo colunista Lenio Streck. Em seu texto, Streck emite uma opinião a respeito da Defensoria Pública, de forma genérica e, na avaliação dos representantes dos defensores, descuidada, partindo de um juízo próprio de valores e interpretação pessoal.
Ao comentar recente debate televisivo, o colunista acusa sem fundamentos o agente representante da Corregedoria da DPE de distorcer teses em prol de interesses corporativos, chegando ao ponto de questionar o papel da instituição, previsto pela Constituição Federal, classificando-o levianamente como "monopólio".
Diante deste fato, a entidade reitera que permanecerá em alerta e sempre a disposição de seus associados.
Leia a nota da AMPRS:

NOTA DE APOIO AO PROCURADOR DE JUSTIÇA LÊNIO STRECK
A ASSOCIAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL vem a público rechaçar a nota de repúdio elaborada pela ADPERGS – Associação dos Defensores Públicos do RS – em virtude do artigo publicado em 08/02 pelo jornal O SUL, assinado pelo Procurador de Justiça Lenio Streck, pelas razões a seguir expostas :
a) a participação deslocada do Defensor Público, corregedor da Defensoria Pública, no debate realizado na TVCOM - que tratava da proposta de emenda constitucional que visa à retirada dos poderes de investigação do Ministério Público, a conhecida PEC 37 ou da IMPUNIDADE - transpareceu que a mola propulsora para ali estar era fomentar o ataque às prerrogativas do Ministério Público;
b) se a ADPERGS avaliza e apoia o Defensor Público no posicionamento em que questiona a atuação do Ministério Público (e, portanto, de seus Promotores e Procuradores de Justiça) na sua atribuição institucional e legal (o direito de investigar), esta entidade de classe assume uma postura absolutamente incoerente quando não aceita as observações do Procurador de Justiça Lenio Streck, questionando a Defensoria Pública (e, portanto, os Defensores Públicos) nas suas atuações institucionais e legais;
c) se até a famigerada PEC 37 é motivo de debates e discussões jurídicas, encontrando um Defensor Público animado em defendê-la publicamente, com muito mais razão devem ser debatidas as percucientes e pontuais observações propostas por Lenio Streck, tais como a co-legitimação para a defesa dos hipossuficientes, o papel da DPE nas ações coletivas e o alcance do atendimento ao público, bem como se ainda subsiste a prerrogativa infraconstitucional de prazos dobrados, mormente na seara criminal, diante da regra constitucional da paridade de armas.
Porto Alegre, 09 de fevereiro de 2013
Victor Hugo Palmeiro de Azevedo Neto,
Presidente



Matéria indicada por Clóvis Mamedes

domingo, 10 de fevereiro de 2013

A MORDAÇA DA IMPUNIDADE



ZERO HORA 10 de fevereiro de 2013 | N° 17339

EDITORIAIS


A pressa com que parte do Congresso tenta encaminhar a votação a chamada PEC da Impunidade é reveladora dos muitos interesses envolvidos na questão. A Proposta de Emenda Constitucional que pretende amordaçar o Ministério Público e outras instituições, retirando-lhes a prerrogativa da investigação, já foi aprovada numa comissão especial e está pronta para chegar ao plenário da Câmara. Enquanto questões relevantes para a maioria da população são ignoradas ou engavetadas na Câmara e no Senado, é de se destacar a rapidez com que a PEC tramita no parlamento. Por que tanta celeridade em casas legislativas invariavelmente lentas quando a pauta trata do interesse coletivo?

Porque, também desta vez, o interesse da maioria não é o que importa. A PEC da Impunidade, assim apelidada, tem interessados diretos dentro do próprio Congresso. Há uma clara tentativa de represália a promotores e procuradores que contribuíram, nos últimos anos, para o esclarecimento de casos de corrupção na atividade pública, tanto no Legislativo quanto no Executivo. Nem mesmo alguns excessos pontuais, de promotores que encaminham à Justiça denúncias mal fundamentadas, comprometem o papel da instituição. Pela Constituição de 1988, o MP é uma instituição autônoma, ao contrário das polícias, que se submetem ao Poder Executivo. Essa é uma das grandes conquistas do Ministério Público, que há muito participa de investigações criminais. O resultado desse avanço foi a redução do risco de sindicâncias, algumas controladas pelos próprios envolvidos, conduzirem à impunidade.

Contrários ao poder investigatório do MP alegam que a Constituição não explicita essa atribuição. É uma controvérsia que apenas desvia o debate do seu foco. O que interessa é que o MP não afronta a legislação, conforme manifestações dos tribunais, e que sua efetividade já foi comprovada. São inúmeros os exemplos de que o Ministério Público foi uma instituição ativa, na fase de investigação, no esclarecimento de eventos históricos, como o que levou à aprovação do impeach- ment do então presidente Fernando Collor e, mais recentemente, à condenação dos réus do mensalão. E quase sempre tem sido bem-sucedida a atuação conjunta de promotores e policiais.

A efetividade do MP não se resume, no entanto, a questões políticas ou a acontecimentos de impacto. Sua atuação cotidiana e decidida contribui para que sejam desvendadas atividades criminosas em todas as áreas. A sociedade certamente não terá vantagem alguma se a mordaça pretendia pela Câmara for aprovada. É preo-cupante que a mesma PEC tente restringir atividades investigativas de outras instituições, como Banco Central, Receita Federal, Tribunais de Contas e Ibama. Não resta a mais tênue dúvida em torno da iniciativa. Os que durante décadas desfrutaram da impunidade estão visivelmente incomodados pela atuação dessas instituições.

Um Ministério Público atuante, ao lado da polícia judiciária, é característico de nações desenvolvidas. Países em que a polícia tem a exclusividade para realizar sindicâncias fazem parte do grupo de sociedades primitivas em que, muitas vezes, o poder político e econômico é também o que comanda investigações, acusa e julga. O Brasil há muito superou essa condição, apesar de ainda enfrentar sérias dificuldades nessa e em outras áreas, das quais todos dependem para o pleno exercício da democracia. A PEC da Impunidade é uma armadilha do atraso e por isso deve ser refutada.

O editorial ao lado foi publicado antecipadamente no site e no Facebook de Zero Hora, na sexta-feira. Os comentários selecionados para a edição impressa mantêm a proporcionalidade de aprovações e discordâncias entre as 266 manifestações recebidas até as 18h de sexta. A questão proposta aos leitores foi a seguinte: Editorial defende poder investigatório do Ministério Público. Você concorda?

O leitor concorda

Concordo plenamente. Hoje amordaçam o MP, amanhã a imprensa, e por aí vai. O STF não se intimidou e fez um belo trabalho no julgamento do mensalão, mas está perdendo poder, por força da lei criada e aprovada pelos congressistas. Que jamais farão uma lei que não seja para benefício próprio. Uma lei, antes de aprovada, deveria receber o visto do Judiciário, do Executivo e da advocacia. Visto que atinge toda a população do país. Quem poderia mudar ou, pelo menos amenizar isto, é o eleitor. Infelizmente, muitos se deixam levar pela mentira, pelas falsas promessas ou por uma esmola e acabam votando nos fichas-sujas. Albino Perleberg, Pelotas (RS)

Concordo. Em um país em que a corrupção “corre frouxa”, não se mostra possível afastar o Ministério Público da atuação também no campo da investigação. Aliás, graças às investigações do MP, em conjunto com demais instituições, é que muitos fatos relevantes para o nosso Estado e país são descobertos. Impossibilitar o MP de investigar interessa a muita gente, mas, especialmente, aos políticos de moral flexível. Denise Isabralde Borba, Porto Alegre (RS)

Concordo, pela seriedade e imparcialidade dos promotores públicos. Precisamos de setores da sociedade proativos na defesa dos cidadãos de bons costumes. E todo brasileiro precisa se manifestar e participar deste processo. Pedro Valdir Muller, Bento Gonçalves (RS)


Vão amordaçar o MP para não atrapalhar a falcatrua dos poderosos.Ricardo Garcia dos Santos

O leitor discorda

O Ministério Público é parte acusatória e, sendo parte, não pode investigar, sob pena de ser parcial. Caso a acusação possa investigar, corre-se o risco de serem colhidas as provas que unicamente interessem à acusação para fins de condenação. A investigação tem que ser produzida por instituição que não seja parte, que não seja interessada na acusação ou na defesa. As polícias Federal e Civil não são partes do processo, portanto não têm interesse na causa, sendo estas as instituições que a CF determinou que investigassem. No Brasil, separamos a atividade de investigar (polícia) da de acusar (MP), defender (advocacia) e julgar (magistratura). Esta separação é que garante a idoneidade do sistema de Justiça criminal. Por fim, temos tido bons resultados com a polícia investigando. Para isto, basta olhar as centenas de operações da Polícia Federal feitas todos os anos. Enquanto a PF faz mais de 200 operações por ano, no caso do MP contam-se nos dedos de uma mão. Luiz Nelson – Brasília (DF)

Quem acusa não pode investigar.Cezar Duarte

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Eu estou no meio termo. Primeiro a LEI não pode amordaçar o Ministério Público e impedir este órgão do Poder Executivo (sim, não existe um quarto poder) de investigar crimes envolvendo autoridades e recursos públicos. A questão seguinte é que o MP andava extrapolando suas funções passando a concorrer com as forças policiais em investigações de crimes comuns, o que não é saudável para o sistema de justiça criminal, que aliás, como disse o leitor Luiz Nelson, não existe no Brasil. E é exatamente a inexistência de um SISTEMA DE JUSTIÇA CRIMINAL ágil, integrado, desburocratizado, coativo e comprometido com as questões de justiça e ordem pública, envolvendo o judiciário, MP, defensoria, forças policiais e setor prisional, onde cada órgão tem um papel definido de pesos e contrapesos, é fomenta as divergências, as mazelas, as ações contraditórias e a impunidade no combate á violência, criminalidade e corrupção. 

Infelizmente, no Brasil Poderes e instituições pensam mais no umbigo, nos privilégios, nos interesses corporativos e na ampliação do espado de poder, do que propriamente na consolidação da justiça, da paz social e da ordem pública.